quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Eu, Newton Cannito, confesso: sou crente

Confesso a quem possa interessar: eu, Newton Cannito, sou crente.

Tenho fé.

Fé de que tudo tem sentido, “que deus não joga dados com o mundo”(Einstein) e existe uma ordem divina. Uma ordem que eu não tenho a mínima ideia do que seja.

Reafirmo: eu tenho fé em algo que não tenho a mínima ideia do que seja.

Minha diferença para as doutrinas (religiosas, cientificas , políticas) é que minha fé sobrevive a minha completa confissão de plena ignorância.

A grande maioria do mundo se divide em dois tipos: os que realmente tem dúvidas e vivem em crise. Vivem perdidos, pessimistas, em depressão, reclamando.

E os que tem fé na vida. Vivem mais plenos, são otimistas. Mas conquistam sua fé se apegando a alguma certeza inconteste. Sao as doutrinas.

Mas ter fé com doutrina é fácil. Dificil é ter fé em meio a humildade de admitir que não sabe o que está acontecendo. Essa é a verdadeira fé em deus.

A verdadeira fé não é doutrinaria. A fé doutrinaria é fé nos homens, em algum homem que concebeu a doutrina. A fé em deus é muito mais que isso.

A fé é algo que nos dá confiança e otimismo pois sentimos “que está tudo certo”. A forma mais comum para chegar a isso é se apegar as doutrinas. A doutrina simplifica o mundo , escondendo do “crente” a complexidade da criação divina. A doutrina é uma narrativa (ou um modelo matemático, no caso da ciência) que dá ordem humana ao aparente caos divino. A doutrina é apenas uma ficção bem construída.

Um exemplo de doutrina religiosa: toda a palavra de deus esta na bíblia.

Nada menos humilde do que acreditar que algum grupos de seres humanos redatores (que, alias, eram muito talentosos e inspirados) conseguiram explicar toda a criação divina. Eu sei que eles estavam conectados com deus, ok. Mas eles ainda eram humanos. Eu prefiro acreditar em deus, não em humanos.

Isso não significa que não existe verdade na bíblia. Com certeza existe verdade lá. Mas é apenas uma parte da verdade. Uma parte que serve muito bem a grande parte da humanidade e dá sentido a existência de muitos homens. Maravilhoso. Sou muito grato aos autores desse livro fantástico. Tiveram uma conexão impressionante com a divindade e vem dando até hoje alegria a milhares de vidas. Mesmo assim, como tudo que é humano, ela é apenas uma parte da verdade.

A verdade mesmo é muito mais complexa. Muito mais. E uma verdade não exclui a outra

Em ciência isso fica mais claro. A física newtoniana não esta errada. Ela funciona dentro de determinadas variáveis. Em outras elas não funciona. Ela é parte da verdade. Já a mecânica quântica funciona dentro de outras variáveis. E a teoria da relatividade em outras. Elas não são erradas. Ao contrário, mesmo sendo antagônicas em muitos pontos, todas são verdadeiras. Deus é isso. Ele consegue ser duas coisas ao mesmo tempo. Nós, humanos, é que somos mais burrinhos e temos que limitar a complexidade divina para entender ao menos alguma pequena parte de sua maravilhosa criação.

O mesmo acontece com religião. Ha quem perca tempo provando que uma determinada crença religiosa é “falsa” pois não se aplica a determinada situação. Exemplo: não existiu Adão e Eva. Pois teve evolução. Quando a pessoa pensa que é falso Adão e Eva porque é verdadeira a evolução a pessoa está sendo doutrinaria. Ela esta acreditando que a verdade científica se contrapõem a verdade religiosa. Na verdade mesmo, ambas são verdades. Cada um para determinada variável social. Quem ataca a crença de Adão e Eva com a suposta sabedoria científica esta sendo tão doutrinário quando o religioso que não acredita na evolução por conta de acreditar em Adão e Eva. É como seu um físico quântico perdesse tempo tentando provar que a relatividade é falsa. O difícil é aceitar que ambas são verdades, cada um para uma determinada variável. Isso é aceitar a complexidade da criação divina.

O mesmo acontece com a variedade religiosa. Cada religião tem uma crença diferente, muitas contraditórias. Podemos acreditar que todas são falsas. Mas é prefiro acreditar que todas são parte da verdade. Se essa narrativa religiosa (ou essa equação matemática) tem uso prático na vida de alguém é porque é parte da verdade.

É fácil acreditar num Deus construído como um personagem humano . O difícil é acreditar em deus admitindo que você não tem a mínima ideia do que se trata. Essa é a verdadeira fé.

Se auto-emburrecer para ter fé é muito fácil.

E perigoso.

Toda doutrina é apenas uma parte da verdade, que não exclui as outras. Se você realmente acreditar que uma parte da verdade (que pode ser a sua preferida) exclui todas as outras você corre o risco de virar um fanático. Foi assim que começaram todas as guerras e extermínios. Como eu já disse as doutrinas (sejam matemáticas, sejam as religiosas , sejam as teorias da história, ou sejam as fábulas) são apenas ficções que inventamos para equacionar algumas variáveis do mundo. São super úteis, tem real uso pratico, seja psicológico, seja material (construir casas, por exemplo). Mas são apenas ficções . Parte da verdade organizada pela mente humana. O problema é que essas ficções são super bem construídas (o ser humano é burrinho, mas até que para, nosso nível de inteligência, somos bem inteligentes) e podem parecer a verdade absoluta. Nesse momento você vira fanático.

O objetivo mesmo é ter fé em meio a dúvida. Ter fé sem precisar de doutrina.

Temos que ter fé em meio (e em louvor) ao aparente caos da criação divina.

Temos que ter fé que está tudo certo, mesmo ser ter a mínima ideia do que esta realmente acontecendo. Pois , no fundo, qualquer pessoa que parar para pensar de verdade percebe que não temos a mínima ideia do que REALMENTE esta acontecendo. Porque deus criou o mundo ? Só para testar os humanos? Deus seria tipo o Pedro Bial no Big Brother? (Pode ser verdade para povos do velho testamento, mas me parece pouco para os dias de hoje). Ou falando da criação. Você pode achar que Deus não criou a terra em sete dias como esta no Gênesis. Teve um big bang. Ok, mas e dai? Big bang do que? Algo tinha antes para explodir certo? Quem criou esse algo antes? Porque explodiu? Acho tão absurdo acreditar no Genesis quanto no Big Bang. Odeio quando os cientistas se tornam arrogantes e fanáticos com esse tom de que entenderam tudo só porque descobrirão através de umas fórmulas matemáticas (ficção) que uma pedra grande explodiu bilhões de anos atrás. Acho isso lindo e misterioso, adoro ler sobre isso. Mas isso nao pode nos fazer perder o fascínio pelo mistério da criação. É uma história linda essa da bola que explode. Mas ela não tem começo. Quem criou a bola? Será que essa bola foi criada em sete dias? Resumindo: eu concordo que o Big Bang realmente aconteceu, li os livros de ciência. Mas acho que o Genesis também aconteceu. Pois se existe pessoas que acreditam nele ele passa a acontecer. São ambos parte da verdade, não a verdade absoluta.

Por tudo isso afirmo que a verdadeira fé não é arrogante. Ela não tem explicações para tudo. A verdadeira fé admite sua ignorância. Essa é a única fé que consegue louvar a beleza da infinitamente complexa criação divina. Esse é o verdadeiro pensamento científico. E é o verdadeiro impulso religioso.

E para terminar uma confissão final. Comecei o texto dizendo que sou crente e que tenho fé. Admito que gostaria de ser sempre um homem de fé. Tenho tentado, mas nem sempre consigo. As vezes tenho crises de fé e deixo de ser otimista com a existência. Mas pretendo nunca mais ter esse tipo de crise. E para não ficar chamando a crise vou, a partir de agora, sempre afirmar que tenho fé incondicional e irrestrita, para ir convencendo meu cérebro (e o mundo envolta dele) dessa verdade e tentar , assim, alcançar a verdadeira e infinita fé em tudo. Mesmo no que eu não concordo. Quando eu tiver fé no que eu não concordo, concordarei com tudo e terei fé em toda criação divina. Aí sim, estarei louvando a maravilhosa diversidade divina.

domingo, 13 de novembro de 2011

Sobre magos e loucos

A diferença do mago para o louco é que o mago tem o poder de materializar seus delirios.
Uma forma de curar a loucura é ensinando o louco a materializar seu delirio.
Um mundo criativo é um mundo aonde todos os loucos conseguiram se tornar magos.
Só existe um delírio realmente delirante: acreditar que o delírio alheio é apenas um delírio.

terça-feira, 2 de agosto de 2011

Menos respeito e mais amor incondicional

O debate sobre documentario brasileiro é obcecado pela ideia de respeitar as pessoas.O problema é que respeitar é pouco.Temos que amar.

Mais que respeitar temos que amar as pessoas mesmo. Amar incondicionalmente, amar sem julgamento, amar mesmo coisas que julgamos ruins.

Isso de respeitar é papo pequeno burgues de quem tem medo do diferente e/ou é tão egocentrico que acha que pode destruir a vida do outro

Mas um filme não destroi a vida de ninguem. Só acredita nisso documentaristas/burgueses/egocêntricos que levam a vida em torno do cinema. As pessoas levam a vida em torno da vida mesmo.

Por isso, não precisa ter medo de destruir a vida das pessoas. Eles não são vitimas, são pessoas como nós. O respeito que precisamos é fazer contratos. O respeito se resume a pegar a cessão de imagens. O resto é amor.

E quando amamos o personagem/pessoa na filmagem ele pode revelar coisas que os pequenos burgueses respeitadores abominam, como crimes, taras, éticas malucas, etc.

Mas eles só revelam esse tipo de coisa se o clima for de amor incondicional. Algo que os documentaristaristas/respeitadores /assustados não conseguem fazer

Respeito é distanciado, amor é empático.

Um principio para o documentário brasileiro: menos respeito e mais amor incondicional.

sexta-feira, 22 de julho de 2011

Um pouco de fantasia para o cinema brasileiro

É triste mas precisamos constatar: o cinema brasileiro não tem heróis, franquias e nem universos transmidiáticos.

Estamos fazendo setenta filmes por ano há algum tempo mas, até aonde eu consigo lembrar, apenas dois filmes conseguiram se tornar uma marca além do cinema: "Tropa de Elite" e "Taina". O primeiro, no entanto, por ser drama social não tem grande potencial de desenvolver um universo transmidiático em torno dele. Para universo transmidiático o gênero fantasia é muito melhor.

Alias, isso também é impressionante: não temos filmes do gênero sci fi e fantasia. Nosso cinema é viciado em realismo. Temos ótimos filmes reais (sejam comedias, sejam dramas), mas não passeamos nunca no reino da fantasia.

E é assim que a historia se repete ano a ano. Chega as ferias escolares e nossas salas são ocupadas pelos super heróis norte americanos, constantemente recriados e oriundos do mundo todo: do nórdico Thor, até a internacionalista equipe do X-Men. Os americanos querem o mundo todo para eles. Bobos somos nós que deixamos eles ocupar.

Um desavisado poderia dizer que não temos condições técnicas de fazer fantasia no Brasil, por conta dos custos de efeitos especiais. Bobagem. Nossas finalizadoras tem feito coisas ótimas em publicidade e, com mais investimento, teríamos condições de levar os efeitos ao cinema. Pode não ser com a ultima tecnologia, mas seria com a penúltima e tenho certeza que seria suficiente para conquistar nosso público que deve estar ansioso por uma fantasia 100% nacional. O que falta então? Falta um choque em nosso cérebro, uma quebra completa de paradigmas mentais de nós mesmos, realizadores de cinema e gestores de politicas públicas para audiovisual.

Alguns empecilhos mentais que tem atrapalhado o desenvolvimento da fantasia em nosso cinema:

a) Desprezo por heróis. Temos grande dificuldade (vergonha, mesmo) em construir heróis que não sejam anti-heróis. Complexo de vira-lata bravo. Podemos é claro ter ótimos anti-heróis, mas podemos também ter, sem medo de ser feliz, heróis nacionais.

b) Desprezo "esquerdista antigo" pela fantasia. O melhor da esquerda mundial já sabe há tempos que o mundo da fantasia é importante na construção de novos valores. Mas nosso cinema - que nem de esquerda é mais -ainda parece contaminado pela antiga tradição de realismo socialista que contaminou a esquerda no século passado. Será isso mesmo? Será que o realismo socialista ainda nos domina? Tenho dúvidas também, me parece surreal demais. Mas não vejo outra hipótese. Ou alguém tem alguma explicação diferente para nosso cinema ser quase que inteiro feito de filmes que são dramas e comédias sociais?

c) Desprezo por cinema de gênero. No Brasil, resultado das ideias do Glauber, o gênero é considerado "fórmula" americana e fica em oposição ao cinema autoral. O cinema autoral é sempre o filme pequeno, anti-indústria. Bobagem. Basta ver que quem dirige os filmes de super-heróis americanos de maior sucesso são autores, muitos oriundos do cinema independente, como Tim Burton (Batman), Sam Raimi (Homem Aranha), Branagh (Thor). Os americanos não se prendem a essa falsa separação entre cinema autoral e superprodução de gênero. Ser autor é grife e isso é importante para a indústria de cinema, que é uma indústria de alto capital criativo. Filme sem autor nos EUA são os telefilmes que são de produção pequena.

d) Restrição de investimento. Ainda pensamos pequeno na politica audiovisual e ficamos chocados quando um filme custa mais que 15 milhões. Bobagem. Temos que ter coragem de fazer super produções pois temos potencial criativo para sermos uma grande potência audiovisual e só seremos se investirmos pesado em alguns filmes. Mas quando se fala isso alguém sempre argumenta: mas é dinheiro público (incentivado). É verdade. Mas e dai? Dai que, na ideia simplista de democracia que predomina, o dinheiro público deveria ser distribuído igualmente entre todos os pretendentes a fazer filmes. Isso não é política audiovisual industrial. É política assistencialista, lembra bolsa família. Nosso cinema merece mais e nosso povo merece um cinema que pense grande. Temos é claro que ter preocupação com o dinheiro público, mas o critério não é distribuir igualmente a grana entre todos os cineastas necessitados. O critério de investimento deve ser o retorno do filme, em impacto social e bilheteria. Portanto, se investir mais, tem que ter mais retorno, simples assim. Como qualquer indústria, aliás.

e) Por fim: sinto muita falta de uma indústria de História em Quadrinhos no Brasil. Foi nos quadrinhos que surgiram todos as franquias americanas. No Japão e Coreia é aonde até hoje são testados os personagens. O HQ é a base de uma indústria criativa que construa personagens. Infelizmente isso é pouco debatido no Brasil. Ainda pensamos politica cultural segmentada por mídia (cinema, livro, etc..). HQ fica numa fronteira indefinida e é desprezado. Enquanto não tivermos uma política industrial agressiva, criando inúmeros estúdios de criação de historias e muitas editoras especializadas, não teremos personagens nacionais fortes. É no HQ que testaremos muitos personagens para ver em qual o público irá se identificar e aí investir pesado na produção audiovisual transmidiática.

Artigo publicado na Revista de Cinema- http://revistadecinema.uol.com.br

O mercado de distribuição

Dei uma entrevista para uma tese de mestrado sobre distribuição e organizei umas idéias que penso sobre o tema

Segue para quem se interessar

A pergunta foi: Como esta o mercado de distribuição audiovisual hoje e quais as tendências de futuro?

Temos poucas distribuidoras brasileiras e poucas politicas de apoio a elas. Está aumentando agora, mas precisa aumentar mais.

Temos que pensar em apoiar empresas financiadoras, que comecem a trabalhar com empréstimo e capital de risco. Essas empresas podem estar associadas a distribuidoras. Aí aproximaremos mais a distribuição da produção, caminho natural dos mercados

Mas para isso precisamos também ter mais empresas de distribuição e empresas focadas em nichos.

O cinema ainda esta na logica apenas de block buster. O mercado americano estruturou assim e todos estão seguindo essa logica. Tem que aprender a trabalhar com nichos e cauda longa.

Possivelmente as empresas de distribuição do futuro não serão de cinema. Serão distribuidores de todas as mídias ao mesmo tempo. É mais focada em um tipo de conteúdo, do que na distribuição física

A logica de distribuição de cinema ainda é analógica.

A empresa de distribuição clássica se preocupava com logística (entrega das copias de película nas salas). Isso vai acabar com a distribuição digital.

Então o que sobra a distribuidora? A promoção. A promoção é a grande função da distribuidora do futuro. Não sei nem se o nome será distribuição, pode ser que o nome mesmo da empresa vai ser agencia de promoção. E a distribuição do futuro deverá também saber bolar a estratégia de cada filme. Alguns são para publico genérico e de massa. Outros são para filmes de nicho.

Imagino empresas especializadas em distribuição de conteúdos ecológicos, por exemplo, que atuem no segmento e distribuam vários conteúdos para esse setor. Conteúdos para celular, cinema, TV, vídeo, games, etc... Outra empresa pode focar em conteúdos homossexuais e assim por diante.

Além disso a distribuição também é de uma época aonde você visava ATINGIR o publico. A logica digital esta mudando. É a logica de pessoas seguindo o que querem. Veja o twitter, é a lógica dos seguidores. Mais do que atingir é convencer as pessoas a nos seguirem

É outra logica.

E cada vez mais cresce a importância do boca a boca. Ele sempre foi importante, mas no mundo digital é ainda mais importante. Então tem que pensar estratégias transmidiáticas e trabalhar com comunidades.

E para isso as distribuidoras do futuro serão agregadoras de conteúdo, com marcas e identidades fortes, que agreguem conteúdos e criem comunidades com pessoas ligadas ao mesmo interesse que são seguidoras da empresa.

segunda-feira, 4 de julho de 2011

RUA - Revista Universitária do Audiovisual

Link da revista impressa: http://www.ufscar.br/rua/site/wp-content/uploads/rua_projeto_site_completo.pdf

domingo, 3 de julho de 2011

O Sabido que não era Sábio

Dr. Canneta não era sábio mas era sabido!
Ele vivia em pânico. Mas queria viver!
Ele tinha fé que existia um lugar melhor. Não percebia que o lugar melhor podia ser, ali mesmo! Que o lugar melhor era só um jeito de ver!
O lugar melhor para ele era outro lugar! Um lugar muito longe!
Um lugar aonde ele não estava. Mas que ele queria estar
Dr. Canneta nasceu criança. De cara acho aquilo tudo um saco!
Mas Dr. Canneta também era humano
Ele se escondia por trás de uma figura pública: o Sr. Cannito!
Ou pensava que se escondia
Pois para todo mundo que olhava, o Dr. Cannito era igual ao Dr. Canneta!
Na verdade, quem se escondia era o Dr. Cannito!
Dr. Canneta dominava!

sexta-feira, 1 de julho de 2011

Saudades da propaganda (trecho de um romance antigão meu e nunca publicado, chamado Segurando os pratos)

O que eu mais sinto saudade são os slogans e jingles publicitários. Na época eu mesmo os criticava por incitarem o consumo mas nunca entendi que aquilo era materialização do sonho de uma sociedade unificada, que poderia ser integrada através do consumo de bugigangas. A publicidade era o culto do capitalismo. Hoje tenho saudade daqueles dias de união, daquele momento onde todos cantavam mesmas músicas, mesmos rimas e todos consumiam as mesmas coisas.
Na minha infância a publicidade foi extramente presente. Lembro-me da: Groselha vitaminada, Milani... Yahoo! É uma delícia, yahhoo. No leite (yahoo) no refresco e no lanche, yahoo”. Anos depois esse gritinho simpático da excelente groselha genuinamente nacional virou nome de um site da internet. Obviamente um site de capital virtual (eu pessoalmente nunca entendi o que é isso) e multinacional. Antropofagia ao contrário.
Lembro-me com tristeza do momento em que a propaganda começou a ser segmentada, propaganda na Rede Record começou a ser diferente de propaganda na Rede Globo, que era diferente de propaganda na TV a cabo, etc.. Até que chegou o dia em que os empresários perceberam que os pobres não consumiam mais nada além de contrabando do Paraguai em lojas de 1 real e que não adiantava mais anunciar nem na Record . Logo depois acabou os programas populares e os grupos empresáriais pararam de emissão de sinal para TV aberta - restando apenas a TV por assinatura.
Alguns grupos independentes tentaram utilizar o espaço vago para fazer programas alternativos. No começo eles cresceram com certa autonomia e experimentalismo Mas um dia a repressão chegou, foi rápida e extremamente violenta..
Os programas era acusados de incitar a violência e o sexo, de perverter as crianças, etc, etc... Em poucos dias centenas de video-makers foram assassinados e estúdios destruídos. Os principais suspeitos pelos assassinatos foi o Grupo por Qualidade na TV, movimento que começara anos atrás próximo a partidos de esquerda, mas que, naqueles dias, era dominado pela Juventude Politicamente Correta e pela Liga de Mães Solteiras mas com Moral. Ambos os grupos combatiam esses programas por considerarem que educavam mal as pobres crianças, (escrever depoimento: irmãozinhos mais novos dos jovens PC (sigla de Politicamente Correto) e filhos das MSM – Mães Solteiras mas com Moral). Os movimentos políticos de oposição, já armados na época não, ofereceram resistência pois os videomakers não eram militantes filiados. Eu, por sorte, era apenas um colaborador, nunca acreditei muito no movimento e fui poupado. Além disso na época eu estava muito mais preocupado com minha candidatura a presidente do Brasil.
Com o fim da emissão de sinal para TV abertas milhares de pobres começaram a tentar vender seus aparelhos de televisão. Foi um verdadeiro desespero. Os que perceberam que aqueles programas não iam durar muito, venderam logo suas TVs e ainda pegaram um pouco de dinheiro. Mas a maioria manteve sua TV em casa até o último instante, até ser exterminado o último grupo de produção independente. A maioria deles não conseguiu vender a TV para ninguém. Quando houve a reforma urbana e os pobres foram expulsos das cidades a maioria deixou as TVs no barraco e nas casas, e ela passou a fazer parte do cenário. Ao que parece foram derrubadas junto com as casas.

O ÚLTIMO POBRE

O último pobre que entrou numa universidade pública se chamava Josué. Eu o conheci quando fazia cursinho. O vestibular estava cada vez mais díficil e o número de vagas reduzido.
Na época já existia o Movimento pela Assistência Estudantil se fortalecia. Eles se aliaram ao Movimento pela Qualidade de Ensino e a FUVEST e decidiram dar uma bolsa de 20 salários minímos para cada pobre que entrasse na USP, além de carro do ano, seguro saúde. O CRUSP virou um flat para estudantes mais carentes. Servia comida no quarto, atendimento de primeira.
A idéia era interessante: um pobre não pode estudar na USP pois não tem tempo de estudar em tempo integral e por isso atrapalha o cotidiano das aulas. A única solução é se um pobre entrar devemos fazer ele ficar rico. A idéia parecia mirabolante mas foi aceita como projeto. Para viabilizá-la era necessária reduzir, a curto ou médio prazo, o número de pobres ingressantes. Para isso contaram com a ajuda do Movimento Estudantil, através do Movimento pela Qualidade de Ensino, da Associação de moradores do CRUSP (fascinada com a idéia do flat)
A idéia foi genial e tudo se juntou. Qualidade de Ensino, Excelência Exclusão Social e Assistência Estudantil Foi uma saída ótima para os pobres que já tinham ingressado: em troca de adesão ao movimento, a assistência estudantil melhorou bastante. A comunidade universitária ficou unida e foi possível implantar as reformas.

Ansiosos

Estamos numa mesa de bar. Meninas conversam ansiosas.
Dois caras no canto, aguardando uma brecha. Eles não se conhecem e disputam as femeas.
Um é mais agitado, outro mais silencioso, tem tom de sabio chines.
O sabio chines parte ao ataque. Quer destruir o macho oponente:
- Você é sempre ansioso assim?
- Como?
- Você está muito ansioso. Isso não é bom.
Ansioso sorri. Sem ansiedade alguma, ele comenta:
- Esse tipo de conselho é de graça ou você quer marcar no cartão?
Meninas percebem o conflito. Silenciam a ansiedade e olham atentas.
O sabio chines fica ansioso. O momento é decisivo, ele tem que se controlar. Sabio responde:
- Porque a ironia? É sério...
- A ironia é em relação a ti. Adorei esse personagem de sábio chinês. Voce sempre interpreta ele?
As meninas todas riem. Foi um gol de placa: Ansioso 1, Sabio ansioso 0. Mas Sabio ansioso tem uma arma mortal para a plateia de ansiosas meninas espirtiualizadas. O sabio disfarça a ansiedade. E continua:
- Desculpe, mas não é um personagem. Você não pode admitir que alguém é diferente de ti. É difícil admitir que eu não tenho ansiedade.
- Ah, vai se foder!
O ansioso 1 sai da mesa, irritado com a agressividade ridicula do Sabio Ansioso.
As meninas ansiosas concluem que o Ansioso é mesmo muito ansioso. E eles não querem hoemns ansiosos. Querem sabios chineses. Aquela noite o Sabio chines ansioso conseguirá despejar sua ansiedade numa ansiatica trepada com uma menina ansiosa enquanto o Ansioso descarregará a ansiedade em bebidas alcoolicas e numa briga com o garçon do boteco também ansioso. No dia seguinte, no entato, ambos estarão de ressaca. E estarão muito menos ansiosos.

ME DÁ UM BEIJO

E: Me dá um beijo, então
Beijinho dado.
E: Não, aí não.... aqui.. na boca
Ana sorri..
A: Está louco
E: De casquinha mesmo serve..
A: Mas nem matando
E: Calma, mulher. Não esquenta. Senta aí, deixe eu explicar.
Ana senta. Ele continua:
E: Passarão 24 horas até eu te ver novamente. Se tu me deres um beijo na boca - mesmo de casquinha - eu deliro, pulo de felicidade. Serão as 24 horas mais felizes da minha vida. Ficarei preparando os detalhes de nosso próximo encontro. Caso contrário serão horas horríveis. 24 horas de histeria, eu pensando: qual será a dessa mulher? Será que vale a pena atacar logo? Pode ser que se eu der muito encima ele não queira mais? Ou o contrário? Estará ela apenas fazendo ciúmes para algum ex- namorado, e etc... Serão horas horríveis.
A: Horríveis para ti. Para mim serão maravilhosas.
E: O prazer de saber que estarei sofrendo.
A: Exatamente.
E: Nossa, eu sofrerei pacas, ele diz sorrindo.
A: Aprenda a curtir.
E: Já estou curtindo. Aliás para falar a verdade, curtindo muito. Essa ansiedade está uma delicia.
A: Beleza. Então é isso, né. Até mais.
E: Mais um no rosto?
Ana sorri. Longo beijinho no rosto. E os dois se despedem

MINHA VIDA SEM ALIEN

Foram anos e anos de fé.
Veja essa foto. O que voces veem?
Um borrão, certo?
Hoje eu vejo so isso. Mas por anos e anos olhei em borrões como esse e concluia: HÁ VIDA FORA DA TERRA!
São aliens, extra terrestres.
Eu era um ufologo!
Admito que foram anos felizes, de fé, esperança. Meu cotidiano depressivo de pequeno funcionario ganhou novo significado. Eu olhava para aquele chefe chato e pensava: mal sabe voce que há vida fora da terra!
Nada era chato para mim...
Mas os anos foram passando e a ufologia virou um vicio. Eram fotos e mais fotos, borroes e borrões, encontros noturnos cada vais mais longe para encontrar os aliens. E nada. Nada.
Para mim que é bom, nada..
Tive muitos amigos abduzios, alguns por dias
Outros foram até mesmo... Desculpe o termo... Violentandos.. Estuprados... (fala com imenso prazer)
Os aliens fizeram EXPERIENCIAS com eles!
Mas para mim nada
Nem uma abduçãozinha básica eu tive o prazer de ter.
Era só foto de borrão para aqui, foto de borrão para ali, nem um contatozinho de segundo grau com outra ufologa eu consegui
Fui ficando revoltado, rancoroso
E cada vez mais obcecado pela ideia de ser abzudido.
Cheguei ao fundo do poço, larguei o trabalho, mudei para o meio do mato, usei drogas e finalmente, pela primeira vez, vi um borrão ao vivo no ceu... Achei que ele ia descer até mim, me abduzir, mas... na hora agá... Passou o efeito. Foi só ilusão.
Hoje superei meu vicio e sou um novo homem. Meu nome é João o e faz 4 anos, 3 meses e 10 dias que eu olho borrões em fotos e não concluo tratar-se da prova irrefutável de vida fora da Terra.
Eu sou um ex-ufologo assumido.
Não acredito em mais nada e quando olho para meu chefe não fico pensando em aliens. Nem chefe eu tenho mais, minha vida mudou. Foquei na materia, destrui colegas de trabalho e ganhei um cargo de chefia! Comprei minha casa e meu carro. Meu carro!!
Hoje eu posos dizer: sou um vencedor!!!
Mas cá entre nós eu admito: eu trocava tudo isso por um contatozinho imediato com um alien barato numa esquina qualquer do cosmos.

terça-feira, 7 de junho de 2011

"Estamos juntos"

"Estamos juntos", novo filme do Toni Venturi, é uma excelente cronica sobre a solidão do "estrangeiro em sp" (todos nós). No elenco estão todos bem. Mas eu destaco o Cauã, no papel de um homossexual. Ele deu show. Vive um personagem patetico, que poderia ser apenas comico, mas consegue ter momentos de autencia dramaticidade. Nos rimos dele, mas depois nos identificamos. Grande personagens, magnificamente escrito, dirigido e interpretado.

segunda-feira, 6 de junho de 2011

Pequena fabula sobre relacoes de trabalho no ambiente artistico tupiniquim


por Newton Guimarães Cannito, sexta, 3 de junho de 2011 às 09:23




Era um artista. Pagava mal os funcionarios e dizia que eles eram parceiros. Trabalho colaborativo. Aumentava os horarios, mas era por amor a arte.

Era pobre. Acreditava que ser pobre é ser anti-capitalista. Na verdade ser pobre é ser vitima do capitalismo.

Era um socialista e acreditava que todos devem ser iguais na pindaiba.

Não era um capitalista pois não acumulava capital. Era miseravel. Mas irradiava mais miseria do que qualquer capitalista já conseguiu fazer.

terça-feira, 26 de abril de 2011

Tolerar os Racistas?

Ou: pode um roteirista branco escrever um "filme negro"?

Recentemente, em um debate público em um festival de cinema, uma jovem negra manifestou sua “decepção” ao saber que eu, um branco, escrevi o filme “Broder”, do diretor negro Jeferson De. Fiquei meio chocado: estaria eu, com minha mente branca, tirando o “pedigree artístico” de um “filme negro”?

A jovem era muito simpática e bem intencionada. Ela foi de uma sinceridade ímpar e manifestou uma opinião que me pareceu compartilhada por outras pessoas. Uma opinião racista, mas uma opinião que respeito. Como respeito qualquer outra.

Ao invés de simplesmente desconsiderar a pergunta vou fazer um exercício de entender melhor os motivos. Uma coisa é fato: eu, como branco, não sei o que significa sofrer racismo por ser negro. Ao fazer filmes sobre o tema fui descobrindo minha ignorância. Fazendo pesquisa para escrever “Cidade dos Homens” (seriado da Globo) descobri um mundo de racismo que acreditava estar extinto. Fiquei chocado ao descobrir que há preconceito para contratar atendentes de loja e garçons negros. E que muitos negros até hoje negam sua própria cor. Já em “Quanto Vale ou é por Quilo?” o roteiro investigou a lógica da escravidão e aprofundamos nas contradições raciais. E em “Broder” tive o prazer de fazer um filme com um diretor negro que superou o rancor de cor e sabe tocar nas questões raciais com a complexidade necessária.

Mas, por mais que eu pesquise o tema e me aprofunde, é evidente que eu - como branco - não poderei nunca ter a experiência de sofrer o racismo que um negro sofre. É claro que o artista pode suplantar isso e entrar na alma alheia (caso contrário Chico Buarque não escreveria sobre mulheres), mas é evidente que não tive essa experiência.

Por outro lado eu, como branco, conheço um ponto de vista que nenhum negro conhece: o ponto de vista dos “brancos racistas”. Num filme sobre racismo esse é um ponto de vista importante. Afinal os filmes que fiz não são apenas sobre “negros” e sim sobre a relação entre negros e brancos. E nenhum negro conhece esse ponto de vista do racista branco. Criado numa família branca de subúrbio pude conviver com todas as contradições do racismo brasileiro, muito mais complexo e ambíguo do que o racismo americano. Tive um tio racista que casou e amou uma negra por toda a vida. Lembro de eu, criança, na mesa de almoço, ouvindo meu tio falar coisas racistas e percebendo - pela primeira vez na vida - que minha tia era negra. Perguntei ao meu pai “Mas a tia não é negra?”. Ele mandou eu ficar quieto e nunca mais discutimos o assunto. A cor de minha tia foi um assunto tabu na família. Tabu até para ela. Tenho familiares que acham triste namorar com uma negra, mas ao apresentar a namorada negra a aceitam imediatamente. Minha impressão é que eles são racistas na teoria, não na prática. Seja por humanismo mesmo, seja por vergonha de ainda ser racista, o fato é que os negros sempre frequentaram a família.

Contei isso outro dia em outro debate, dessa vez na Fundação Palmares, com presença do movimento negro. E conclui com uma provocação: será que não chegou a hora de toleramos os racistas? Será que os racistas não são parte da diversidade que tanto defendemos?

Explico. Podemos e devemos combater o racismo, isso é consenso. Para isso já temos leis importantes que são cumpridas judicialmente. Isso é fundamental. É devido as leis que o racismo explícito tem diminuído e aparece em raros casos, como no recente episódio da estudante Mayara que fez declarações racistas em seu twitter. Mas o racismo continua sutil e disseminado. Para combater esse racismo sutil a melhor forma que conheço é tolerar os racistas. E ao tolerar ajudá-los a superar seu próprio racismo.

Para isso temos que ter compaixão e generosidade. Vale apenas lembrar que o racista não é apenas racista. Ele também é uma pessoa complexa. Ao contrário do racista caricatural da Klu Klux Klan, muitos racistas são ótimas pessoas. Tem inclusive, vergonha de ser racistas. Ser racista é uma pequena parte de seu ser. Uma parte que deve ser combatida. E a melhor forma de combater isso é tolerar. E zombar disso.

Uma outra cena me vem a mente. Um senhor branco de 80 anos esta num carro, sentado ao lado de um jovem negro de vinte e dois. O senhor branco fala animado, ele curte a companhia do jovem negro, amigo de seu filho branco. O senhor branco fala coisas racistas. Ele afirma que “não é questão de ser racista, mas os brancos e os pretos não precisam se misturar. Cada um no seu canto”. O jovem negro é ator. Não é muito preocupado com a questão racial. Nem é muito de prestar atenção nas palavras. Mas presta muita atenção na “energia”, no corpo, no movimento. O negro tolerante sente que o branco racista quer ser seu amigo. E esta certo. O senhor branco, no fundo, está impressionado por estar totalmente a vontade ao lado de um negro. É algo inédito para ele. E para expressar isso ele repete seus antigos valores, afirmando que os brancos e os negros não devem se aproximar muito. Ele fala isso ao lado do negro. Ele está sendo racista na fala, não no comportamento. Na teoria, não na prática. Eles vão a uma festa, o negro ensina o branco a tocar tambor, o senhor branco de oitenta anos adora. No fundo, sempre admirou a arte negra. Ele relaxa, curte. No fim da festa, um outro rapaz branco, que ouviu a conversa no carro, zomba do racismo do senhor branco. O senhor branco percebe, toma consciência, se envergonha. Mas se sente perdoado e aceito. Nesse dia ele se tornou menos racista.

Essa cena é real e eu contei no mesmo seminário da Palmares. Incomodou. Um palestrante do movimento negro enfatizou que ele acredita que o jovem negro deveria combater o racismo. Eu concordei. Também acho legal ficar atento e patrulhar permanentemente o racismo, mesmo o sutil. E acho que essa patrulha começa em nós mesmos, brancos e negros. Passa para os outros que estão próximos. E pode até mesmo chegar ao judiciário (em casos mais graves aonde o racismo se efetiva em ações de segregação). Tudo isso é certo. Mas também pensei que essa forma maluca de tolerar o racista pode ser uma forma de combatê-lo. Com esse senhor isso ficou claro: ele ficou menos racista no final. Temos que lembrar que combatemos o racismo, não o racista. Nosso objetivo não é exterminar o ser humano racista. É fazer ele superar isso. Afinal, não seria isso que Mandela fez? Será que viajei? Será que estou sendo racista? Fui longe demais? Admito ter duvidas. Mas quis expressá-las e debatê-las.

O fato é que o debate como um todo foi bem pesado, me senti muito acuado. Quando contei das cenas racistas de minha família uma mulher negra se levantou e perguntou se “eu estava pedindo perdão por ser racista”. Na hora tomei um susto. Na minha mente veio o fato de que racismo é crime, fiquei com medo de ser acusado, perseguido, preso. Mas ali – em público diante de uma platéia negra – decidi pedir perdão. Pedi perdão com sinceridade por todos os momentos que escapou algo racista de dentro de mim. A negra disse que aceitou, brava e superior, tal como um juiz. Fiquei acuado e parti para o ataque, me defendi dizendo que eu também perdoava o racismo da menina que se chocou ao saber que sou branco e escrevi um filme “negro”. Eles disseram que ela não foi racista. Não mesmo? Achei que era, mas não quis debater. No fundo eu acho que não devia ter contra-atacado. Não devia ter enfrentar o racismo negro. Pois ao enfrentar cai na energia da batalha. E, além disso, não posso deixar de lembrar que a menina negra era ótima, muito simpática, educada e parecia envergonhada por estar me discriminando. Era algo maior que ela, ela não tinha orgulho de seu preconceito. Tal como eu não tenho orgulho dos meus.

Foi nesse debate que percebi aonde mora o perigo da estratégia atual de combate ao racismo. Ao patrulhar e perseguir qualquer confissão de racismo, nós temos obrigado as pessoas a esconderem seu próprio racismo. O racismo é apagado, escondido. O problema é que não podemos neutralizar o invisível. Acredito que a melhor forma de combater o racismo é explicitá-lo. Botar um racista num filme pode ser uma forma de neutralizá-lo. Zombar de racistas, por exemplo, pode ser uma ótima forma de combate. Mas hoje, no reino do politicamente correto da arte brasileira, um filme que mostra um personagem racista pode ser acusado de racista. Clint Eastwood e Spike Lee seriam combatidos, teriam até dificuldade em conseguir financiamento.

Concluo com uma proposta de diálogo e convivência. Voltando a criação artística acho que uma obra se enriquece pela mistura. Mistura de artistas de diferentes origens étnicas e sociais. Essa é a melhor forma de combater o racismo. Eu, por exemplo, ao fazer filmes sobre racismo, ao me esforçar para estar no ponto de vista de negros discriminados, tomei consciência de meu próprio racismo. E pude assim, combatê-lo. É um caminho difícil, mas é o único possível. Essa é possivelmente a melhor forma de superar o racismo sutil de nossa sociedade.

terça-feira, 12 de abril de 2011

Bulynai-vos uns aos outros: Pela democratizaçaõ do Bulying!

Uma das hipoteses que circulam sobre o "massacre de Realengo" é que a "culpa" foi do bullying na infancia. Odeio hipoteses simplistas.
Primeira pergunta: é mesmo possível impedir crianças de zombarem das outras? É possivel extinguir o bullying? Segunda pergunta: é desejável?
Tenho um amigo que me disse. Não é possivel. Mas é desejável. Surge então a pergunta: vale a pena perder tempo desejando coisas impossiveis?
E outra: será que o psicopasta se forma ao ser "bulynado" ou ao não bulinar ele mesmo?
O fato é que todos foram bulynados na vida. A diferença é que alguns não bulynaram. O estranho,portanto, não é ser bulynado. O estranho é não bulynar.
Fica então a proposta: um movimento pela universalização e democratização do bulying! Todos tem que aprender a bulinar os outros.
Isso seria sair da logica de defender a pobre vítima infantil bulinada e ensiná-la a partir para o ataque. Ensiná-la a não acumular seu ódio e soltar logo essa energia.
Cidadania também é isso: dar poder a todo cidadão para "bulynar" a quem lhe "bulyna".
Sou a favor da "bulinação" ampla geral e irrestrita. Pois é melhor zombar que matar.
Um principio democratico inovador: "Todo cidadão tem o direito de "bulinar" a quem lhe incomoda e o dever de re-bulinar a quem lhe "bulina" ".
Uma disciplina escolar inovadora:"bulynação 1 e 2: como sofrer e como fazer".
Um livro autobiografico de cabeceira: "Coisas que aprendi ao ser bulynado".
Um livro de psicologia : "Bulynação e auto-conhecimento: voce é o que os outros enxergam de ti".
Um principio de existencia: Bulynadores, se voce não pode vence-los? Junte-se a eles!
Mas agora falando serio: não sou a favor de todo bulyng. So do bulyng com amor!!
Assim como o futebol serve para canalisar a disputa num ambiente ludico, aulas de teatro podem encaixar o bulyng (que é resultado de preconceito) num ambiente ludico.
Mas para isso não podemos ter preconceito com o preconceito. Não podemos odiar o bulyng, temos que ama-lo.
A melhor forma de reprimir um bulinador é bulina-lo com amor. É zombar dele com afeto. Mostrar o quaõ ridiculo é ser como ele é.
Não se faz isso levando o bulinador tão a serio. Não se faz isso reprimindo e deixando o preconceito escondido embaixo do tapete e condenando o bulying a viver escondido, fora do ambiente da escola, longe dos olhares vigilantes dos adultos. Temos que trazer o preconceito a luz. Revela-lo. E zombar dele.
Quem pode fazer isso bem é oficinas de teatro que não sejam caretinhas e sabiam tocar nas feridas sociais. Em especial, oficinas de palhaço.

sexta-feira, 1 de abril de 2011

Venda do DVD

Já está disponível para a venda sob encomenda do DVD Jesus no Mundo Maravilha... E Outras Historias da Policia Brasileira no site da livraria cultura:

http://www.livrariacultura.com.br/scripts/videos/resenha/resenha.asp?nitem=22490320&sid=968174250134155752143367&k5=39C201D4&uid=



'Jesus no Mundo Maravilha' é o documentário brasileiro que mostra a vida de três militares que, após serem exonerados da polícia, trabalham num parque de diversões. Num clima onírico - enquanto surram o palhaço, brincam com crianças e rodam em brinquedos - eles revelam seus valores, seus sonhos e seus crimes. Enquanto isso, uma família vítima de policiais chora a morte de seu filho e clama por justiça.


Mídia: DVD
Região: 4
*Brasil, Austrália, Nova Zelândia, México, América Central, América do Sul
Ano de produção: 2007
País de Produção: Brasil
Gênero: DOCUMENTÁRIO
Duração: 52 minutos
Volumes: 1
Sistema: NTSC
Sistema de Cor: Colorido
Idioma Original: PORTUGUES - DOLBY DIGITAL 2.0
Legenda: ESPANHOL INGLES

sexta-feira, 18 de março de 2011

Maria Bethania e “os consagrados pelo oligopólio”

Até ontem eu estava achando um absurdo essa perseguição ao projeto do blog da Bethania. Pois o projeto é maravilhoso e urgente. Acho fantástico ter poesias lidas pela Bethania na internet. Parabéns a quem teve a ideia e aos proponentes.
Também não tem nada de absurdo um blog custar 1,3 milhão. Depende do blog, obviamente. Mas esse tinha mais de 300 vídeos e imagino que outras estratégias on-line. Acho maravilhoso e importante que os criadores de conteúdos de internet também sejam bem renumerados. Dizer que internet é feita gratuitamente ou a baixo custo só interessa a quem não faz internet. Renumerar bem quem faz internet é parte importante de uma política de democratização cultural e de democratização econômica.
Mas hoje eu li sobre o cache da Bethania: 600 mil (50 mil por mês). Pessoalmente, me pareceu um salario alto demais para a Lei Rouanet no formato atual. Ainda mais sabendo que esse valor é quase metade do orçamento. Em termos estritamente técnicos, falando de análise de projetos, é estranho uma só pessoa ganhar mais que toda a equipe junta. É uma critica pertinente. Mas é apenas uma crítica pontual. Foi –na minha opinião – uma avaliação equivocada da Comissão que avalia projetos. Uma comissão que – vale destacar – não é Estatal, é pública (pois tem representantes de toda a sociedade). Acredito que isso deve ser revisto.
Mas não quero aqui discutir erros pontuais. Acho mais interessante perceber como esse debate revelou questões mais amplas do mercado cultural brasileiro como a concentração da mídia (e de mercado) e o consequente “rancor de classe”. Além disso, esse debate permite que debatamos uma questão importantíssima: a relação entre democracia e meritocracia.
Para que o debate avance tranquilamente vale dizer que a única coisa que estamos discutindo aqui é o “INTERESSE PÚBLICO” em pagar uma alta “renumeração” a artista principal de um projeto. Só isso. Não vamos misturar com preconceitos e rancores. Não acho que faça sentido criticar o artista como indivíduo, nem a produtora proponente. Eles pedem o que acharem que é justo, desde que esteja na lei. É função da comissão pública do Ministério dizer se o pedido atende ao interesse público. O fato é que a Lei atual permite esse alto salário. O projeto foi aprovado, então a produtora e os artistas não fizeram nada de errado. Vamos parar de personalizar, pois isso parece rancor de classe. Esse rancor é um sintoma de algo mais generalizado que é uma perseguição aos artistas consagrados. O fato – gostemos ou não – é que a Bethania ganha super bem mesmo. Vamos conviver com isso e seguir com o debate.
O que estamos realmente discutindo é algo mais interessante: a lei que paga salários com dinheiro público deve permitir altos salários?
Não é uma questão tão simples quanto parece. Se simplesmente impedirmos altos salários teremos dificuldade em aprovar qualquer projeto com artistas consagrados, que no mercado ganham valores muito altos. Alguém pode dizer: “Bethania, quer ganhar bem? Então que vá ao mercado!” . Ok.. Mas o fato é que “no mercado” a Bethania não poderia fazer poesia. Faria apenas o que já faz. Não inovaria nos conteúdos. Será que não interessa ao estado brasileiro ter projetos que ele apoia conduzidos pela Maria Bethania? Eu acho que interessa. Ainda na linha de personalização alguém poderia afirmar: “Ela já é rica, que faça as poesias de graça”. Seria o lado Ong da Bethania, uma doação dela ao seu povo. Não concordo com essa lógica assistencialista, pois acredito que ela condena os bons conteúdos a serem feitos sem renumeração. Ou seja, os bons conteúdos ficarão para sempre meio amadores. Profissional mesmo é o “mercado”, que faz sempre o mesmo. A inovação é assistencialismo. Isso só interessa a quem não quer fazer bons conteúdos e já faz a mesma coisa. Eu acho fantástico que a Politica Cultural incentive conteúdos de qualidade e dispute com o mercado para que grandes artistas façam conteúdos de qualidade. Por isso acho que devemos começar a pensar mecanismos diferenciados (e dentro dos valores de uma ética pública) que incentivem grandes artistas a fazer projetos de alta qualidade artística.
Por outro lado acho que esse debate mostrou algo que julgo saudável: as pessoas começaram a ficar bravas com os altos salários dos artistas consagrados. Finalmente.
Vale lembrar que esses altos salários não são de hoje. Devido ao nosso modelo de televisão centralizado e com audiência muito concentrada, há poucos escolhidos que são consagrados. Eles ganham salários milionários. Todos os outros ficam na pindaíba. Isso é algo que existe há décadas. Acho saudável que todos nós – que não somos “consagrados pelo oligopólio” – comecemos a perceber esse absurdo. Mas não adianta criticar o artista individualmente. Nem o Ministério da Cultura por um erro pontual. Vamos perceber o que esta realmente por trás disso tudo.
Acho que o que estamos criticando mesmo é o oligopólio da indústria cultural brasileira. Somos o país com mais concentração de audiência. Isso gerou uma pequena casta de escolhidos que ganham milhares de vezes mais que os outros. Isso é algo estranho numa democracia. Temos que batalhar pela democratização da mídia, que incluirá a democratização econômica. Quer falar de altos salários? Será que não é o caso de discutirmos os contratos milionários dos artistas televisivos brasileiros? E os poucos músicos “consagrados pelo oligopólio”? Muitos (e muitos) ganham mais de 1 milhão por mês. Todo mês! Isso é normal? Não é um escândalo público? Como eu disse não critico os artistas pessoalmente. Mas falando em termos públicos: é estranho que exista tamanha concentração. Alguém pode argumentar que o dinheiro é privado, das empresas, não é dinheiro público. É verdade. Mas é função do poder público regular o mercado. E aí há um caso claro de concentração econômica que pode ser minimizado por politicas de regulação. E é sempre bom lembrar que a televisão é concessão pública. Nosso modelo de concessão escolhe poucos canais, poucos detentores privados, que escolhem quem são os BILIONÁRIOS. Se democratizássemos os canais (com a tv digital isso é possível) democratizaríamos a renumeração de artistas e as rendas seriam mais próximas. Não existiria rancor de classe e nem existiria o “caso Bethania”.
Mas temos que tomar um último cuidado com isso: a democracia não pode se opor a meritocracia. Nos últimos anos avançamos muito em políticas de democratização. Mas não avançamos em politicas meritocráticas. A democratização permitiu que milhares de realizadores mostrassem sua face e começassem a realizar suas obras. Mas eles não conseguem se sedimentar no mercado, ficam sempre dependentes do poder público. O mercado continua fechado para eles (e daí surge o rancor anti Bethania). O que esta acontecendo é um certo apartheid: os consagrados ficam com o mercado, todos os outros “não consagrados” estão querendo monopolizar as “verbas públicas”. Sempre que um artista consagrado quer apoio público os “não consagrados” ficam furiosos pois consideram que o Estado é o mercadinho deles. Temos que romper essa falsa dicotomia.
Para isso é preciso conciliar democratização com meritocracia. Acho que temos que discutir claramente que “artistas já consagrados” devem ter políticas específicas para eles. Vou falar da área de cinema, que eu acompanho mais. Acho surreal que cineastas já consagrados como Babenco, Furtado, Domingos Oliveira, Sergio Bianchi e muitos outros estejam hoje sofrendo imensas dificuldades de captação. Eles poderiam ter apoio “automático” para a realização. Não automático para a eternidade, é claro. Se eles errarem muitos filmes em seguida , quem sabe, podem perder esse apoio. Mas até hoje eles já acertaram vários filmes. Tem boas chances de acertar os próximos. É interesse público que eles façam mais filmes e façam rápido. É interesse do PÚBLICO mesmo, do público espectador, que já provou que gosta de seus filmes e que tem o “direito” de ver novos filmes deles na tela. Perseguir eles em nome da democratização é fazer uma “democratização corporativa” (uma expressão em si contraditória), que é criada apenas do ponto de vista de quem esta na “área”, de quem “faz cinema”, esquecendo do verdadeiro interesse público, que é o interesse da pessoa que consome cultura.
Por outro lado a meritocracia também interessa aos jovens talentos. Mas “não a todos” os jovens talentos. A democracia meritocrática interessa apenas aos artistas mais talentosos. Quando começarmos a fazer políticas meritocráticas os jovens que acertarem em seus primeiros curtas terão mais facilidade para produzir seus longas. Os que erraram em seus curtas, terão mais dificuldades. Isso parece obvio, mas não esta acontecendo com clareza. Devido a imensa pluralidade de comissões com critérios diferenciados e com jurados que são escolhidos a partir de indicações da própria classe estamos ficando reféns de uma lógica corporativa, aonde a decisão sobre qual filme vai ser apoiado é tomada a partir do gosto (e até mesmo dos contatos pessoais) desses membros da comissão. Politizamos demais a politica cultural, a escolha artística virou resultado de uma politiquinha corporativa. Isso é uma confusão entre democracia e corporativismo. Isso não interessa a ninguém, muito menos ao PÚBLICO espectador.
Mas voltando a música. Lá o caso é diferente, pois existe mercado real. No cinema estão todos presos na lógica de dependência do estado (é como se Bethania precisasse de apoio estatal para gravar seu cd). O interessante é que esse caso “Bethania” revelou várias coisas, pois chocou a “música de mercado real” com os “mecanismos de apoio público”. E esse choque ajudou a revelar algumas contradições do mercado cultural brasileiro.
Para concluir apenas reenfatizo o que já disse: acho que temos que aproveitar esse caso para discutir questões mais de fundo, como o oligopólio da mídia brasileira que resulta em imensa concentração econômica; a necessária harmonização entre democracia e meritocracia, e a necessidade de pensarmos politicas culturais públicas específicas para artistas consagrados.

Newton Cannito é cineasta e escritor. Foi Secretario do Audiovisual do Ministerio da Cultura. (www.doutorcaneta.blogspot.com)

Minha futura biografia - por Dr. Sofridão

Numa inédita ação promoção futurista disponibilizo aqui trechos de minha futura biografia, que ainda não foi lançada e muito menos vivida. O titulo é : “Resumindo é um Caos Completo: Vida, obra e amores do palhaço Doutor Canneta.”. Não gostei do palhaço, vou processar para tirar. Mas de resto, apoio a iniciativa.
Mesmo sem ter acontecido no mundo da materia, a biografia já esta escrita no astral e começou a ser recebida pelo colega Doutor Sofridão (entidade que vive na mente do sofredor Eduardo Benaim). Dr. Sofridão, além de escritor e sofredor, é também um homem de visão. Ele enxerga a frente, vê até o que não existe e já começou a investir na minha futura biografia.
Exibimos agora trechos do capítulo "
Canetadas Maravilhosas: A História de uma Obsessão", aonde Dr. Sofridão relata a conturbada relação que terei em minha futura vida – ou não, sempre gosto de pensar que posso ir mudando essa história , mas que ela existe hoje, existe - com o Palhaço Maravilha, personagem documental do filme “Jesus no Mundo Maravilha: e outras historias da policia brasileira” (www.jesusnomundomaravilha.blogspot.com), obra que revelou ao mundo minha personalidade:
Canetadas maravilhosas, por Doutor Sofridão:
“Canneta ficou tão maravilhado com o Palhaço Maravilha, seu muso inspirador no arrivismo circense e midiático , que o perseguiu em vários trabalhos até o final da vida. Depois do primeiro encontro no parque de diversões em Jesus no Mundo Maravilhosa, do polêmico reality show, de ter nomeado Maravilha como chefe de gabinete em suas gestões frente aos Ministérios da Cultura (no governo Orlando Silva) no da Educação (governo Aécio Neves) e no da Justiça (governo Francisco Everardo), depois da volta do exílio imposto pela Igreja Católica em uma articulação com a crítica cinematográfica, Canneta ainda levou Maravilha a participar de vários programas de TV "mundo cão". No fim da vida, os dois já idosos, Canneta dirige um reality show da terceira idade no asilo para artistas da periferia de São Paulo, onde Maravilha se refugiara durante exílio de Canneta. Na última diária de gravação, uma estranha morte abalou a todos e conferiu tempero ao programa aumentando em alguns pontos os índices de audiência - Até hoje um caso não solucionado (laudos apontam envenenamento). Um deles morreu fisicamente, mas viveu por alguns anos o palhaço Canneta-Maravilha. Por conta da semelhança física de ambos - que se acentuou ainda mais na terceira idade - o sobrevivente ainda interpretou o palhaço louco pela fama em intervenções públicas, em festas da elite e, por fim como o assessor para assuntos aleatórios no talk show do ex-galã Marcos Garcia, agora exibido na TV Gazeta, logo após o talk show do já centenário Ronie Von. Portando no bolso a carteira de identidade dos dois, Canneta Maravilha, autor de uma pegadinha (sua paixão em termos de dispositivo documental) que dura até hoje, escreveu seu nome na história do entretenimento brasileiro, provocando a ira dos direitos humanos e dos críticos cinematográficos".

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Ser mas não ser, eis o filão

Henrique Alberto de Costa Lima e Silva, mais conhecido como Zé da Silva, foi o maior não-ator da história das artes dramáticas nacionais. Atuou em mais de 800 trabalhos, entre peças, filmes, novelas e performances.
Silva teve uma vida difícil. Após não atuar por anos como playboy comedor de atrizes ele partiu para a não atuação mais dramática. Revelado por Fernando Meirelles e Fátima Toledo (dois precursores na utilização de não-atores profissionais) ele fez um não-sucesso imediato. A partir daí não-atuou em inúmeros papéis. Fascinado pela não-atuação shakeasperiana, Silva, fez grandes não-atuações de personagens clássicos como Ricardo III, MacBeth e Hamlet (aonde cometeu a famosa gafe-criativa: “Ser, mas não ser. Eis o filão”). Sua não atuação mais famosa foi em Romeu e Julieta, aonde não-atuou nos dois papéis, trocando de perucas com uma velocidade impar, tal como só um grande não-ator consegue fazer. Sua Julieta, mega feminina e delicada, foi considerada pela já senil Shakeasperóloga Barbara Heliodora a não-Julieta perfeita. Atuou também como não-cantor, não-interpretando muitas músicas clássicas, num estilo único e imediatamente reconhecível.
Sua fama se estendeu ao exterior. Ficou notório mundialmente quando recusou o Oscar de Melhor Ator, explicando que ele nunca atuou. Foi assim que surgiram as categorias de Melhor não Ator principal e Melhor não-ator coadjuvante, hoje fundamentais na premiação.
Silva foi também um estudioso. Sua tese não-academica “ Não-Atuação em Cinema e Televisão” investigou as bases a-historicas da não-atuação em rituais dionisíacos e no cinema neo-realista.
Preocupado com a não-profissionalização da categoria Silva criou o Sindicato de Não-Atores, que hoje é o maior sindicato do planeta, reunindo quase 60% da população brasileira existente fisicamente e uma quantidade ainda superior de não-atores falsos, que existem apenas em perfis do facebook.
Silva era também um homem ligado à educação. Criou o primeiro Curso Regular de Não-Atores que através de terapias altamente especializadas converteu milhares de atores a não-atores. O próprio ex-ator Wagner Moura (que tinha ficado viciado no refrão “ninguém sai”) só conseguiu superar seus cacoetes interpretativos após o curso de não-atuação organizado por Zé da Silva.
Silva é um símbolo para nosso país tropical. Representa nossa capacidade de trabalhar fingindo que não trabalha, de dominar fingindo que não domina, de SER fingindo que não é.

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Piadas Paises Arabes

(serie de textos para twitter)
Inspirado no Brasil, Muamar Gaddafi lança campanha pela auto estima libanesa: "Sou ditador e não desisto nunca".
Extra! Extra! Achei uma solução para os Países Árabes dominados por ditadores! É o Curso Sarney de Transição Democrática Controlada.
Nosso mais antigo coronel bota uma burca e vai as Árabias ensinar aos ditadores a mágica de viver na democracia e ficar para sempre no poder.
Curso Sarney de Transição Democrática Controlada: é o Brasil ensinando ao mundo a mágica de conviver harmoniosamente em meio a dominação.

SOBRE VEADOS, POLITICOS E CINEASTAS

O cineasta é um intelectual que dá entrevistas sobre os filmes
Sempre achei estranho a palavra cineasta. O que mais termina com "asta"?
Entusiasta, pederasta..
“Cineasta” parece adjetivo. Qual profissão termina com asta? Será que ser cineasta não é uma profissão e sim uma “qualidade do meu ser”?
Cine-asta. Cine-rasta. Cine-astro. Cine-astro tem tudo a ver. No Brasil cine-asta é antes de tudo uma figura midiática: o cara que da entrevista sobre o filme.
Millor já dizia que política é o star system de gente feia. Cineasta é o star system para artista feio. Cineasta é o político pop.
Uma amiga lembrou outra profissão, além de cineasta, que termina com “asta”. Ginasta. Perdi, playboy.
Mas é uma exceção que confirma a regra. Cineasta está mais para ginasta do que para advogado e engenheiro.
Será que é porque, tal como os ginastas, o cineastas vivem fazendo malabarismos? O cineasta é o ginasta do cérebro.
No perfil me defini como ex-político. Mas aí lembrei do coronel Sarney dizendo na Globonews: política só tem porta de entrada, não tem de saída. Ai, que medo...
Será que não existe ex-político? Lembrei dos policiais de meu filme dizendo que não existe ex-puta. Uma vez puta, puta sempre serás!
Lista de coisas que não existe “ex”: político, puta, bandido, mafioso, vampiro, veado... Veado?
Essa é uma polêmica séria na Liga dos Machistas Homofóbicos Esclarecidos. Existe ex-veado? Ou uma vez veado, sempre veado?
A polemica segue. Se o cara deu só uma vez já é veado para todo o sempre? E se o cara deu e não gostou? Ainda assim é veado?
Isso do gostou é importante. Tenho um amigo ator que deu por anos, mas jura que não é veado. Pois nunca gostou. Deu só porque precisava.
Por outro lado tem cara que nunca deu , mas sempre teve vontade. Será veado?
É uma diferença filosófica. Como se define a identidade? Pelo “eu interior”, a alma? Ou pelas ações práticas na vida?
A primeira definição é francesa, a segunda é americana.
E a polêmica continua. E se o cara deu, mas parou de dar? Ainda assim continua veado? Veado é tipo o Flamengo? Uma vez flamengo, sempre flamengo!?
To tentando deixar de ser político. Mas que vicia vicia. Não é fácil. E não tem ajuda psiquiátrica pública para ex-políticos largarem o vício.
Somos uns viciados incompreendidos. Será que não existe o EPA? Ex-politicos-anônimos? Só espero que na sala lado não tenha o EVA: Ex-Veados-Anonimos.
Até imagino a sala do EVA: tipo boate de strip, cheia de Evas tentadoras tentando seduzir ex-veados melancólicos que dão depoimentos tristes.
O objetivo é converter o ex-veado em homem mesmo. Pois uma coisa é ser ex-veado, outra bem diferente é ser homem.
Outra coisa que vicia é ser cineasta. Como não é bem uma profissão, é um adjetivo que define o seu ser, a gente se apega a essa “identidade”.
Mesmo sem filmar há anos, mesmo vivendo de outras coisas (tipo produzir mostras), as pessoas ainda continuam se definindo como cineastas.
Seria bom ter um ECA. Ex-cineastas-anonimos. Muitos seriam até da ECA (Escola de comunicações e artes). Os ECA da ECA. Tenho vários amigos que precisam. Eu mesmo.
ECA, alias, sempre me lembrou MELECA. O Mel que ECA.
É duro admitir, mas acho que eu (e mais um monte) virou cineasta fascinado pela entrevista do Walter Salles. Achando que podia ser como ele e sem dar importância ao fato dele ser dono de banco.
É a imagem do intelectual midiático que fascina os jovens futuros cine-astros. E, no fundo, a gente pensa que uma hora vai dirigir (e comer) a Débora Secco.
Mas já foi a época que atriz dava para cineasta. Isso é anos 60, aonde artista-intelectual ainda tinha prestigio e existia musas como Helena Ignez. Agora, as Ignez atuais, são só alcoólatras desesperadas.
E as atrizes charmosas são empregadas da corporação televisiva. Elas começaram na malhação e cresceram em ambiente hermeticamente fechado: o PROJAC.
As atrizes atuais não dão para cineastas-intelectualizados. Dão para diretores de TV (ex-atores) no início e terminam casando com outros atores e/ou empresários.
O PROJAC é tipo um zoológico que concentra as melhores espécimes de nosso DNA tupiniquim. Elas fazem reprodução assistida.
E como é interesse da corporação, essas espécimes não podem reproduzir com cineastas-intelectualizados. Se o cara pensa muito, contamina o DNA ideal da beleza alienada corporativa.

sábado, 19 de fevereiro de 2011

A tristeza do Dr. Alegria

O Doutor Alegria, coitadinho, vive de mau–humor. “Nada me deixa mais mau-humorado do que pessoas que não estão sempre alegres!”, explica ele.
Sempre bravo e irritado Dr.Alegria é, no entanto, um otimista. Ele tem sempre um plano para gerar um mundo mais alegre.
Um otimista e um batalhador. Mesmo com dificuldades financeiras, Alegria coordena equipes e lidera amigos deprimidos. Do alto de seu constante mau-humor da duras ordens para que todos fiquem mais alegres!
Dr.Alegria jamais aceitou a tristeza. E, portanto, jamais aceitou a si mesmo.
No passado, Alegria foi um químico maluco que queria a fórmula perfeita para vencer a depressão. Até que um dia, ele explodiu o laboratório. Nascia assim o dr. Alegria, o herói mau-humorado que luta contra a tristeza. Verdade ou mentira? Não se sabe. Mas para Alegria era verdade. Era seu mito de criação.
O fato é o Alegria desistira da química, mas não de sua luta. Alegria luta diariamente contra a tristeza. É obcecado por ela, aliás.
Quando há pessoas felizes a sua volta, Alegria nem nota. Mas basta ver um depressivo que ele parte para cima, tal como um cachorro bravo, dando ordens para que ele fique mais alegre.
Às vezes, à noite, Alegria sonha em chegar ao poder. Quem sabe ali, do alto, bem do alto, o Alegria conseguirá mudar o mundo. Ele se imagina no palanque discursando com ótima oratória: "No meu governo a alegria reinará. Nem se for à força!”. E nos seus pensamentos mais secretos, Alegria faz até o trocadilho: “Nem se precisar de forca!”.
Mas durante os dias, na prática mesmo, o Dr. Alegria esta sempre trabalhando. Sempre batalhando. Sempre tentando construir um mundo melhor. É hiper ativo e só descansa quando está completamente exausto.
E só fica exausto após um pilequinho. O fato é que o Dr. Alegria, coitadinho, nunca esta alegre; mas, vira e mexe, bebe. Beber é a mania do Dr. Alegria. Só a marvada pinga que lhe atrapalha.
É na ressaquinha que Alegria sai da hiperatividade e consegue, finalmente descansar um pouco.
Nesses dias de ressaca, o Dr. Alegria sai para andar no parque. Um lugar lindo, cheio de passarinhos, com crianças brincando e adultos praticando esportes. Mas Dr. Alegria não nota nada disso. Imerso em sua tristeza, Alegria não percebe a alegria ao seu redor.
Ele costuma passar caminhando ao lado de um parquinho, aonde dezenas de pais brincam com seus filhos. Mas ele não tem tempo para essas bobagens. Seu cérebro, ao ficar de ressaca, deixa de ser ativo, mas fica melancólico e reclamão. "Antigamente, o mundo era muito melhor", costuma pensar o Alegria.E, no exato momento em que ele lembra como em sua época as crianças eram mais felizes, uma bola de vôlei acerta sua cabeça. Alegria se assusta. Uma criança vem buscar a bola e corre em direção a Alegria. A criança vem sorrindo e seu olhar convida o Alegria para brincar. Pode ser algo simples, um chute estiloso, uma cena clownesca, qualquer coisa. A criança só pede um sinal, algo que consagre a brincadeira e a alegria. O Doutor, no entanto, ainda esta assustado com o choque e furioso por ter saído do transe. O Alegria olha bravo para a criança e chuta a bola sem vontade. Ainda tem tempo de pensar o quão perigoso pode ser andar no parque. "Já pensou se essa bola me acerta o cérebro?".
Além das análises macro-sociais, Dr. Alegria também cede a momentos mais melodramáticos. “Eu podia ter dado mais sorte”. “Eu merecia mais!!”, bradava o furioso cérebro tristonho do Dr. Alegria. “Eu podia ser um homem mais feliz, ter filhos, família.” “As mulheres nunca me deram bola!!”, reflete ele ao passar ao lado de um grupo de mulheres disponíveis que sorriem para ele.
Mas a ressaca e a tristeza passam logo logo. O Dr. Alegria é, antes de tudo, um forte. Ao fim da tarde, ele já esta hipermotivado e parte novamente para sua solitária batalha constante para chegar a Alegria perfeita.

sábado, 29 de janeiro de 2011

A primeira vez que eu morri - conto 2

A primeira vez que eu morri foi a mais sofrida.
Eu estava assustado, com medo, pensava que a primeira morte seria a ultima. Nada pior do que achar que existe o ultimo. Por mim, tiraria esse tipo de palavra do vocabulário.
Além disso, eu ainda não me julgava pronto para morrer. Afinal, eu não tinha ficado rico, eu ainda não tinha comido a Juliana Paes (nem nenhuma equivalente), eu ainda estava gordo, eu ainda não tinha tido filhos pois só podia ter filhos após ficar rico, eu ainda não tinha feito meu livro pois só podia fazer meu livro após ficar rico, eu ainda nem plantara uma árvore e não plantaria uma árvore nem após ficar rico.
Portanto, quando saquei que ia realmente morrer eu optei por resistir. Sou brasileiro e não desisto nunca. Rebelde e obsessivo eu iria lutar até o fim. O fim! Sempre ele, me apavorando, me obssedando.
E uma coisa eu posso dizer: o obsessivo é, antes de tudo, um forte.
E quem é forte sofre.
Lutei e lutei cada vez mais sozinho. Minha mãe vinha me consolar falando de vida após a morte. Eu gritei muito com ela, a espantei, a expulsei. Não quero consolo. A morte é injusta. Ainda mais para alguém que ainda nem ficou rico. Não sou homem de trocar o certo pelo duvidoso. Vou lutar para viver aqui em vida. E bla, bla, bla...
Minha mãe tadinha. Ficou muito triste de me ver tão bravo.
Foi muito doído, sofri muito. Só consegui morrer quando pifou meu cerebro, entrei num transe maluco de pesadelo, enlouqueci, não sabia mais o que era sonho o que era real, nem pensava mais nesses termos, e aí consegui passar. Ufa! Mas não tinha ainda passado. Foi uma morte longa, cansativa, obsssessiva, demorada.
A segunda vez que nasci voltei mais pragmático. Não perdi tempo com estudos, diversões ou bobagens em geral. Já voltei no meu foco: enriquecer e comer a Juliana paes da época. Não perdi um segundo. Com trinta anos já estava rico e já tinha comido umas 15 juliana paes da época. Fui um sucesso. Depois não sabia mais o que fazer, continuei enriquecendo, comi mais centenas de Julianas paes da epóca, viciei em cocaína, morri de acidente de carro. Doidaço de ansiedade joguei o carro no poste. Nada me satisfazia. Por mais rico que eu ficasse sempre tinha alguma mulher que não queria dar para mim e algum dinheiro que era dos outros. Morri em protesto contra a vida.
A terceira vez que vivi já nasci meio tristinho. Não tinha mais vontade de ficar rico e percebi que não tinha como superar a morte. Virei filosofo sem livro publicado. Só pensava na morte e na inutilidade da vida. Passei a vida toda pensando que a vida não tinha sentido. E nem senti a vida passar. Não resisti para morrer, nem morri em protesto. Apenas me deixei morrer. Mas, na hora da morte, quando pensei que nada tinha sentido, eu curti a vida. Estava com febre alta, me deram uns remedios loucos e relaxei. Peguei um transe legal e curti minha passagem. Pela primeira vez eu sai de mim e tive um daqueles flash backs rememorativos. Tinha passado a vida ensimesmado em mim mesmo, mas na hora da morte revi vários momentos, percebi o sorriso de minha mae me olhando no berço, um momento poético de mau humor de meu pai (um fofo aquele coroa), uma professora da universidade meio gordinha me paquerando que nem reparei pois estava pensava na inutilidade da vida..Sei lá, mas de repente eu vi um monte de coisinha bonita que eu não tinha visto. Foi um presente. E não fiquei triste por não ter aproveitado. Apenas me senti um mané. Percebi bons momentos que tive e morri feliz de ver que a vida, no fundo, no fundo, podia ser gostosinha. Pela primeira vez desencarnei com leveza.
Foi uma morte ótima, cheia de esperança, sem o bruximo que me incomodou tanto em outras mortes, dormindo o sono dos justos, sonhando em voltar logo para a vida, para curtir todos os momentos, quem sabe plantar uma arvore, quem sabe publicar um livro, quem sabe gastar uma boa grana num ótimo jantar, quem sabe comer a Juliana paes da época com mais carinho e atenção e, quem sabe até, comer e casar com a professorinha gordinha de filosofia que me paquerar na próxima vida. Foi uma morte super gostosa.
E finalmente eu nasci feliz. Já cheguei curtindo a vida. Saquei que o negocio mesmo é agradecer o tempo todo. Se agradecer em todos momentos da vida, vai morrer tranquilo, mega agradecido, até já cansado de tanto agradecer. E percebi que para quem esta vivo o que vier já é lucro.

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

A primeira vez que eu morri

A primeira vez que eu morri foi a mais dramática.
Um belo tiro na boca, miolos espatifados colados no teto, carta de despedida “perdoando” a famíla para deixar todos culpados, tudo que eu tinha direito.
Inicialmente, meu plano parecia ter dado certo. Minha melodramática construção cenica da morte despertar o interesse do público. Eu aumentara meu IBOPE e por alguns dias fui o protagonista do filme multiplot de minha escola e família. Vendo tudo do alto, eu era feliz e até sabia. Exceto pela dor no queixo (mesmo sem ter corpo , eu sentia uma ligeira dor no queixo) eu vivia o filme que planejara e curtia a felicidade sádica dos grandes vingadores. Felicidade sádica? Bem... No fundo, no fundo, eu era infeliz e não sabia.
Mas como não sabia eu ainda era um homem sadicamente feliz. Homem? Bem sei lá. Eu era sadicamente feliz.
Mas aconteceu algo que eu não esperava: logo me esqueceram. Foi só chegar o carnaval que todos cairam no samba. Foi horrivel. Eu ali, de negro, tentando assombrar meus amigos que me ignoraravam e ex-namoradas que me abandonaram e eles todos vibrando alegria. Nunca me senti tão impotente. Nada é pior para um fantasma do que ser ignorada. É a morte. Até meu pai, que sempre foi ausente em minha vida, continuou ausente em minha morte. Apenas minha mãe sofria. Mas justo ela que sem pre me amou e não merecia isso. De repente me senti culpado e a dor que eu sentia no queixo subiu para toda cabeça e chegou ao peito. Meu coração chorava ao ver minha mãe chorando.
(Uma dica: quando for se suicidar escolha bem a data. Eu sei que você esta num transe interior, mas mesmo assim é importante saber dialogar com o mundo exterior. Afinal o suicídio é um evento externo a você. É o momento aonde seu drama interior é revelado ao mundo. É a estreia de seu melodrama de não aceitação. Por isso, tal como a estreia de um filme, você tem que escolher bem a data para não sofrer concorrências inusitadas. Um exemplo: nada de véspera de carnaval, melhor quarta feira de cinzas.)
Sofri muito até reencarnar. Reencarnei em um buraco qualquer, passei 3 vidas escolhendo famílias depressivas, mãe suicida, pai enlouquecido e empregos de funcionario público em repartição. Só para ir limpando. Foram varias encarnações melancólicas, sozinho, tentando aclamar a mim mesmo. E depois mais umas 4 encarnações vivendo perto de minha antiga mãe, tentando controlar o nervosismo e histeria dela, mostrar que estava tudo bem
Eu nem entendia muito bem, porque reencarnar, não conseguia ter forças para nada, mas também, não reclamava. Apenas vivia.
Dificil mesmo foi recuperar o prazer de viver. Agora, só hoje, eu pela primeira vezes em seculos, reparei em um flor. Era linda, amarela, e suas petalas vibravam ao vendo. Não sei como nem porque, mas logo a seguir, reparei numa menina. Depois na grama, depois no vento, depois em tudo. Não sei como mas pela primeira vez eu lembrei qual é a graça de viver. E a graça é olhar o mundo e agradecer a deus por estar vivo.

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

A goleada da vida

Estou cada vez mais convencido: a consciência e a presença da morte é fundamental para aproveitar bem a vida!
Um único exemplo: imagina se toda vez que eu fosse falar eu tratasse essa fala com a importância das "últimas palavras". Não falaria mais bobagem nunca.

O perigo de pensar na morte é você ficar ansioso e querer aproveitar a vida. Aí fica tudo muito tenso. Isso acontece no inicio, nos primeiros momentos da sua real consciência da morte.

Mas com o tempo a ansiedade passa.

Pois ao pensar sempre na morte você começa a perceber algo fantástico: na grande maioria dos momentos da vida, NA GRANDE MAIORIA MESMO, você NÃO morre!

Você só morrerá por um segundinho. E lá na frente. Até o momento a vida esta ganhando esse jogo. E de goleada.

Aí você vai ficando tranqüilo. Pensar na morte faz voce perceber a vitoria da vida.
Até na hora h, mesmo na hora da morte, você é mais tolerante com a dita cuja. Poxa, afinal o seu time (a vida) esta ganhando de goleada. Que que tem ela fazer um golzinho?
Assim, com a consciência da vitória da vida sobre a morte é que você supera a ansiedade chata de "aproveitar a vida". Mas continua valorizando cada instante dela.

Mas, ao invés de gastar energia em tudo, começarás a escolher mais. Escolher com quem estar, o que falar, o que fazer. Isso é ser um sábio. Deve ser isso a tal da iluminação.

Resumindo: você só chega a iluminação através da consciência da morte. Aliás, o que é a meditação além de uma morte em vida? E xamanismo é ritual de passagem.

É tudo para a gente lembrar da morte, perceber a vitoria da vida e com isso ficar mais tranquilo.

domingo, 23 de janeiro de 2011

A igualdade dos aereo-portos

De tanto viajar ficou sem porto. E meio aereo. So se sentia em casa num único lugar: no aereo-porto.
Em meio a tantas cidades diferentes apenas a permanente igualdade entre os aeroportos o consolava. Era a igualdade em meio a diferença.

Um taxista elitista

Ainda nao sei como tem gente que gosta do Lula.
Ninguem ve o que ele fez com o Brasil?
Veja so meu caso, trabalho de taxista do aerporto.
Antes so pintava gente fina em meu taxi. Era todo mundo limpo e educado. Cada viagem era um novo aprendizado, eu tinha orgulho de meu trabalho.
Agora pinta cada pobre que nem lhe digo. Parece rodoviaria do tiete. So faltou nordestino viajando com gaiola de galinha, o resto tudo eu ja vi. Nao tem condicao.
O problema e que pobre nao tem responsabilidade. Gasta tudo que ganha. E só voce deixar ele classe media que ele gasta tudo.
Ai acontece isso tudo. Caos aereo, por exemplo. Foi por conta disso. Muito pobre pegando voo.
E o transito entao?
veja o caos que esta agora?
Culpa de quem? Do Lula. Quem mandou facilitar o credito de carro zero? Agora aguenta.
Agora esta tudo assim. Um caos. Ate o clube eles invadiram. Sou palmeirense antigo, de familia. Tive que parar de ir no clube. Chegou gente nao sei daonde, parece ate que estou no Corinthians. Nem um clube limpo a gente tem direito.
A praia entao nem pensar. Ha dez anos atras eu deixei a praia grande pois ela corinthianizou, chegou a zona leste em peso. Comprei uma kit em peruibe. Mas eles logo chegaram la tambem. Estou tentando agora comprar em Ubatuba, mas ja nem sei se adianta. Eu compro a peso de ouro, mas os pobre logo chegam e tudo que eu invisto desvaloriza. Antiguidade nao tem valor na era lula.
Ate mesmo Parati foi invadida. Zona leste dominou. Da dó de ver o patrimonio histórico dilapidado pelos incultos.
Tambem o que e que a gente ia esperar. Bem que meu pai avisou que isso de migracao ia acabar dando merda. Comecou com os hospitais. Os caras migravam para SP, ficavam doente e invadiam nossos hospitais. Assim nao tem imposto que chegue. Nem o saudoso prefeito Maluf conseguia resolver. Bem que ele tentava, mas era só ele criar um hospital que chegava uma nova leva de nordestinos. Eu nao sou necessariamente contra a migracao. Se o cara quer arriscar vir para ca , e direito dele. Mas nao tem sentido ele usar o hospital que foi construido com os impostos pagos pelos paulistas verdadeiros. Se nordestino ficar doente, tem que extraditar para o estado dele. Basico.
Mas nos fomos deixando. Nao agimos nos anos 70, nem nos 80. Náo deu outra. O cara virou presidente e abriu o mundo de vez.
Agora eles invadiram total.
Nao sei mais se tem jeito
Nao tem mais para aonde ir.

domingo, 16 de janeiro de 2011

tudo muda. Menos vanguarda

Como todo cineasta de van-guarda ele odiava o Van-Damme.Apesar dele também ser Van. E de ser guarda.
Seu auge foi no dia em que, premiado no Festival, foi aplaudido na van por seus amigos da guarda. Era uma van a Diesel. Uma van-Diesel
Seus amigos da guarda eram como ele: dedicavam a vida a fazer a guarda. Guarda do que? Do exato conceito de van-guarda.
Mesmo fazendo guarda ele não era de todo cão e nem sempre dizia não. E além de gostar de vans e de amar a guarda ele tambem gostava do Van Diesel*.
Mas não contava isso para seus amigos da guarda que andavam com ele nas vans. Mesmo sabendo que as van eram a diesel. Eram vans-diesel.
Mas foi tudo em vão. Cinema no Brasil é assim: não tem chão. E além do mais, "é tão díficil conseguir captação". Toda sua guarda foi em vão. Foi uma vã-guarda.
Hoje, Ele, quando muito, fica em casa. Ali. Sentado. Vendo televisão.
Nunca mais sequer andou de van. Mas , ao menos, nunca mais ficou na guarda.
Agora feliz, Ele brinca com seu filho. E longe da guarda admite que gosta do Van. Do Van Diesel.
E seu filho outro dia confessou. Ele gosta do Van. Do VAn Damme.
E tal com o pai seu filho vai ser, um dia, um cineasta. Mas não será cine-astro. E não vai ser de vã-guarda.


obs:
*vin diesel é o nome correto. Mas tem gente que pronuncia van. Então dei uma adaptada par funcionar a piada.

A onda sonora do LUZ o ilumina

LUZ era um homem cuja realidade se resumia a batalha para superar "o mundo da ilusão".
Foi assim que LUZ passou a vida toda preso na ilusão de que estar superando a i-lus-ão.
A ilusão de LUZ era a sombria realidade do mundo material. Mesmo encarnado ele vivia a ilusão de vencer a matéria. LUZ não curtia Jesus e jamais poria no carro o adesivo "100% Jesus". Carro até vai. Mas carro com Adesivo é muita matéria para o gosto do Luz. Mas, mesmo sem adesivo, o sonho oculto de LUZ era um dia ser “ 100% LUZ”.
Um ex-amigo bebâdo, sábio e sombrio cruzou com LUZ na rua e disse: "Quer virar luz? De um tiro no ouvido!!!".
Mas LUZ não ouviu esse som. Iludido pela luz, LUZ não ouvia sons oriundos da sombra. Luz na verdade, não ouvia som algum. Quando muito, a própria voz.
É que Luz era muito humilde. Tão humilde que ficou dominado pela arrogância típica das pessoas que se auto-definem humildes. E foi assim que não percebeu a realidade dita pelo sombrio corpo material do sábio ex-amigo bêbado dominado pela ilusão.

LUZ ficou sozinho por muitos e muitos anos. Sozinho e arrogante. Com tristeza galopante, LUZ ficou sombrio.
Até que no auge da escuridão a luz finalmente chegou. E veio na forma de som.
Começou com uma mudança sutil em sua material corda vocal.
Há anos o LUZ falava sozinho. Era uma prática oculta: a busca da retórica perfeita com a oralidade ideal. Ele sabia que a voz é música e a música é a mais espiritual das artes. E quando menos esperava, quando já estava nas profundezas de suas sombras, chegou uma luz. E com ela a grande mudança: a voz de Luz alcançou o exato tom iluminado.
Luz sempre falara pausado. Mas antes seu tom era apenas chato. Agora sua corda vocal, numa mutação iluminadissima, desenvolvera uma técnica que dava a impressão que sua voz vinha de longe. De trás. Do alto. Sublime e avante. A voz de LUZ era etérea. O som de LUZ era um som sagrado.
Mas era apenas uma sutil mudança vibratória em sua material corda vocal.
A voz de LUZ causou impacto. Quando Luz falava, seu corpo era como um boneco de ventríloquo, controlado pela luz do iluminado espírito do LUZ. A voz parecia vir de longe, direto da luz até o som, sem se contaminar pela sombria matéria material. Luz não precisava nem mexer a boca, esse tão carnal aparelho sonoro.
Logo LUZ ganhou adeptos. Quando LUZ falava o seu público - que odiava seus próprios degradados corpinhos materiais - vibrava em silêncio respeitoso. De etéreo balão solitário a flanar na ilusão de criticar ilusoriamente o "mundo da ilusão" material, LUZ finalmente, virou uma luz que ilumina. O sucesso foi tanto que LUZ falava em grandes palcos materiais super iluminados por grandes holofotes materiais, para uma imensa platéia de sombrios corpos humanos materiais encarnados que – a procura da própria iluminação e do próprio desapego da matéria - iam ouvir os sons emitidos por LUZ. Ninguém ligava muito para o conteúdo por trás do som, era o mesmo de sempre. O que colava mesmo era voz do LUZ. Ou como disse um fã mais heavy, ainda em início de conversão: “o cara faz um mega som iluminado”.
E foi assim, emitindo sons iluminados, que o corpinho material de LUZ conseguiu, finalmente, ser feliz na parte sombria da matéria. Está certo que LUZ evitava sorrir, pois “seria carnal demais”. Mas era feliz. Quando ele menos percebeu, estava realmente iluminado. Feliz, pleno.
Combater "o mundo material da ilusão" virou uma realidade material. E LUZ chegou a iluminação devido a sua material corda vocal que emitia uma sonora onda espiritual.
Ou como já disseram em algum lugar sagrado: no princípio era o verbo.


Moral da história
Ilusão que só ilude só, é só ilusão que se ilude só. Mas ilusão que nos ilude junto, é realidade.
Nem se essa ilusão for a ilusão de “combater a ilusão”.